A urbanização qualificada de favelas é uma das formas de reduzir os impactos da crise climática, e experiências de países em desenvolvimento podem inspirar o planejamento urbano mundo afora, defende a brasileira Anacláudia Rossbach. Em agosto, a economista foi empossada como subsecretária geral da Organização das Nações Unidas (ONU) ao assumir a diretoria executiva do Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), sediado em Nairóbi, no Quênia. Por videochamada, ela concedeu entrevista ao Estadão de Nova York, onde estava para compromissos do cargo. A seguir, os principais tópicos abordados durante a entrevista.
Indicação e seleção para o cargo na ONU
“Fiquei muito feliz com o convite. Minhas passagens por diversas organizações, governos locais, nacionais, Banco Mundial, instituições internacionais, me ajudaram a perceber que, realmente, estava equipada para participar do processo. Foi um processo de seleção, né? Competitivo. No fim, fui selecionada. É uma vitória que compartilho com as pessoas e as mulheres latino-americanas e do Sul Global.”
Meio ambiente e COP
“Tem uma intersecção grande entre questões urbanas e ambientais. Haverá uma conferência importante em novembro no Egito: o Fórum Urbano Mundial. Vamos lançar um relatório sobre cidades, o World Cities Report, que, neste ano, tem o tema mudança climática. Estamos entendendo, cada vez mais, essa intersecção (das políticas urbanas e de habitação). As cidades têm papel importante nas emissões, são responsáveis por 70% delas, mas por outro lado têm muitas oportunidades para trabalhar.”
Problemas históricos das cidades
“Qual é a história que temos na América Latina, no mundo em geral? Planos diretores, planos urbanos, que são técnicos, top-down (de cima para baixo), sem consulta, sem participação. Muitas vezes, no Sul Global, copiamos modelos de planejamento urbano de cidades que não têm nosso contexto. Algo bacana que aconteceu na América Latina mais recentemente, e no Brasil, é que começamos a aprender a planejar para o nosso contexto. Temos favelas? Sim, temos. Então, vamos coletar mais informações, aprender mais sobre esses assentamentos, desenhar políticas, identificar instrumentos de planejamento que possam ser atrelados a programas de investimento para a regularização fundiária ética.”
Urbanização de favelas e meio ambiente
“Melhorar as condições de habitação nos assentamentos precários e trabalhar políticas de regularização fundiária minimiza a necessidade de construir novas habitações. Novas habitações têm impacto ambiental: onde construir? Já começa no uso do solo, nos materiais etc. Construir uma casa sustentável, do ponto de vista ambiental, é caro. Para as pessoas e para os governos, é necessário aplicar subsídios, embora a manutenção seja mais barata e o impacto ambiental, menor.”
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